sábado, 5 de junho de 2010

Feirense empregado em São Paulo, mas dorme na rua

Aos 34 anos de idade, o auxiliar de cozinha José Francisco Emanuel de Souza, baiano de Feira de Santana, engrossa duas estatísticas à primeira vista inconciliáveis. Souza é ao mesmo um dos 12 milhões de brasileiros que conseguiram emprego com carteira assinada no governo Lula e um dos 13.666 moradores de rua de São Paulo. “O pior não é ter que dormir na calçada. Fico chateado mesmo é quando sou tratado como mendigo ou vagabundo”, lamenta Souza. Dois meses depois de se casar com Mirelle, sua namorada desde a adolescência, ele saiu de Feira de Santana, sete anos atrás, rumo a Ribeirão Pires, na grande São Paulo, onde já viviam quatro de seus sete irmãos. Ali conseguiu emprego num lava-rápido. Ganhava R$ 300 mais gorjetas e não tinha carteira assinada. Mirelle trabalhava como diarista. Com o dinheiro o casal alugou uma casa de três cômodos que hoje divide com as duas filhas, Gisele e Luana, ambas nascidas em São Paulo. Depois de dois anos no lava-rápido, Souza, indicado por um conterrâneo, conseguiu emprego de ajudante de cozinha em um restaurante popular na região da Praça da Sé, no centro de São Paulo, com carteira assinada e um salário mínimo e meio mensais. Passado algum tempo Mirelle também conseguiu emprego com carteira assinada em um salão de beleza. A vida do casal deu um salto. Mirelle se matriculou no supletivo e pleiteia uma vaga no Prouni, programa do governo que destina bolsas em universidades a pessoas de baixa renda. Com as facilidades de crédito, o casal já pensa em comprar uma casa própria. O novo orçamento comportou um aparelho de DVD, geladeira nova, telefones celulares e eventualmente um churrasco nos finais de semana.
Dormitório é uma caixa de geladeira
O progresso do casal, no entanto, tem um inconveniente. Devido à distância, Souza não tinha dinheiro para ir e voltar todos os dias. “Se fizer isso a metade do salário fica na catraca do ônibus”, disse ele. A saída encontrada foi passar a semana na cidade e voltar para casa no sábado depois do expediente. Como também não tinha dinheiro para um hotel, Souza dormia nos albergues mantidos pela prefeitura no centro. Até que dois anos atrás a prefeitura decidiu fechar os albergues. Hoje o dormitório de Souza é uma caixa de geladeira e um cobertor perto do largo São Francisco, junto com outros ex-colegas de albergue.“No albergue era tranquilo. Não tinha cachaceiro nem encrenqueiro. Era um ambiente família. Agora, na rua, a gente vê cada coisa que até Deus duvida. Como é que tem gente que chega a este ponto?”, indagou Souza. Nos primeiros meses de calçada ele presenciou tentativas de assalto e estupro, uso e tráfico desenfreado de drogas, prostituição, violência gratuita. Seu grupo, formado majoritariamente por trabalhadores e famílias de imigrantes, teve que enfrentar com pedaços de pau alguns assaltantes até conseguir sossego. “A lei aqui é outra”, justificou.
Violência
Além da violência urbana, Souza sofreu nas mãos das autoridades. “Não foi uma nem duas vezes que a gente acordou com os lixeiros da prefeitura jogando água. Aí tinha que catar o que pudesse e sair correndo porque quem fica entra no pau da Guarda Civil”, disse. Os abusos só pararam quando o grupo passou a ser conhecido dos assistentes sociais da prefeitura que intermediaram uma trégua com a Guarda Civil Metropolitana e funcionários da Limpurb, a empresa de limpeza urbana. “Ser tratado como um saco de lixo não é brincadeira, não”, recorda Souza. Apesar das dificuldades o ajudante de cozinha não desanima. “Estamos procurando uma casa mais perto do centro. Não aguento mais dormir no aberto toda noite pensando na minha morena lá em casa, no quentinho, com as crianças”, disse ele.
Reportagem do portal IG

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